sábado, 27 de fevereiro de 2016

USO DE PESTICIDAS EM ALIMENTOS


USO DE PESTICIDAS EM ALIMENTOS


No Brasil o uso de agrotóxicos vem sendo utilizado cada vez mais na prevenção ou extermínio de pragas e doenças da lavoura. Os pesticidas, também conhecidos por agrotóxicos, são substâncias que devido as suas propriedades químicas, possuem efeitos letais para determinados seres vivos, inclusive o homem (MATA, 2013). 

Desde 2008, o Brasil é o pais que mais usa agrotóxico no planeta, chegando em 2009, a marca de mais um bilhão de litros de agrotóxicos aplicados, dando o equivalente a um consumo médio de 5,2 kg de agrotóxico por habitantes (LONDRES, 2010). 

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), no ano de 2012, divulgou em seu relatório do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em alimentos, revelando que 36% das culturas eram impróprias para o consumo pelo excesso de toxinas ou pela presença de substâncias proibidas no país (Figura 1).

Figura 1- Distribuição das amostras de diferentes alimentos cultivados no Brasil, segundo a presença de resíduos de agrotóxicos.

Impactos Ambientais:
O uso dos pesticidas no Brasil tem uma importância bastante relevante devido às inúmeras atividades agrícolas exercidas em várias regiões do país, colocando-o numa posição de grande produtor e com isso, proporcionando o crescimento da economia a cada ano, sendo então, responsável por aproximadamente 21% do Produto Interno Bruto (PIB) através do agronegócio (KUSSUMI, 2007; BRAGA, 2012). 

Vale salientar que, com a utilização dessas substâncias químicas, os efeitos ao meio ambiente alcançam níveis exorbitantes de gravidade. Segundo Maraschin e Peixoto (2003; 2007) “O compartimento mais atingido é o ambiente aquático, para onde grande parte dos pesticidas é destinada. A preocupação com a contaminação de ambientes aquáticos aumenta, principalmente, quando a água é usada para o consumo humano”.

A contaminação pode ocorrer por outros meios, como propagação pelos ventos, pela evaporação, que ao atingir a atmosfera distribui esses agentes químicos para o solo ou as águas superficiais e pela disposição inadequada das embalagens vazias contendo resíduos de contaminantes, comprometendo a qualidade da flora e da fauna nativas, sem falar na própria saúde de homem (MARASCHIN, 2003; PEIXOTO, 2007)

Contudo, chega-se a seguinte reflexão: 

Será que os cuidados e investimentos na minimização dos impactos ambientais, provenientes do uso de pesticidas, estão crescendo na mesma proporção que a economia?



Impactos na saúde

Siqueira e Kruse (2008) afirmam que estudos sobre riscos dos agrotóxicos para a saúde humana detectaram a presença dessas substâncias em amostras de sangue humano, no leite materno e resíduos presentes em alimentos consumidos pela população em geral, apontando a possibilidade de ocorrência de anomalias congênitas, de câncer, de doenças mentais e disfunções na reprodutividade humana, relacionadas ao uso de agrotóxicos.

A relação agrotóxicos e saúde humana, movimentam uma série de questionamentos e estudos científicos, os quais enfatizam as intoxicações recorrentes tanto pela ingestão de alimentos contaminados, quanto pela manipulação, quase sempre sem proteção adequada, dos pesticidas. Segundo Veiga et al. (2007, p. 9):

Os EPIs por mais eficientes que sejam, podem reduz a exposição do trabalhador ao produto químico, mas não elimina totalmente a exposição ao agente químico e pesquisadores já alertam ‘na maioria das vezes, parece que os EPIs agrícolas não conseguem evitar a contaminação, o acidente ou a lesão.

Em uma pesquisa realizada (BEDOR, 2008), que estudou o potencial carcinogênico dos agrotóxicos utilizados nas fruticulturas do Vale do São Francisco, revelou que para os agrotóxicos mais utilizados, 87% possuem potencial carcinogênico e 7% são potencialmente pré–carcinógenos, indicando uma evidente situação de vulnerabilidade para o câncer. Adicionalmente, outro estudo realizado na região sul de Minas Gerais, aponta para uma relação entre cânceres hematológicos e a utilização de agrotóxicos (SILVIA, 2008).

Em decorrência a tantas pesquisas e informações levantadas, o poder público tem como missão primordial controlar a utilização dessas substâncias, potencialmente perigosas a vida, com legislação específica para controle, fiscalização adequada e punição aos infratores.


Acordos e Protocolos:
A ANVISA coordena as ações na área de toxicologia no Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, com o objetivo de regulamentar, analisar, controlar e fiscalizar produtos e serviços que envolvam riscos à saúde – agrotóxicos, componentes e afins, e outras substâncias químicas de interesse toxicológico. A Agência realiza a avaliação toxicológica para fins de registro dos agrotóxicos, a reavaliação de moléculas já registradas e normatiza e elabora regulamentos técnicos e monografias dos ingredientes ativos dos agrotóxicos. Além disso, coordena o Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos nos Alimentos (PARA) e a Rede Nacional de Centros de Informação Toxicológica (RENACIAT) e promove capacitações em toxicologia (BRASIL, 2009).

O Brasil tem bons marcos regulatórios sobre o uso de agrotóxicos, todavia a ANVISA e o IBAMA, principais órgãos de fiscalização para a saúde do homem e do ambiente, respectivamente, tem pouca estrutura para fiscalização de um país com as dimensões do Brasil. Por exemplo: Brasil é o maior exportador de soja, de carnes, de açúcar, de suco de laranja e de café. E para a avaliação de agrotóxicos o país conta com a atuação de 46 técnicos, incluindo ANVISA, Ministério da Agricultura e IBAMA. Em comparação, a Divisão de Agrotóxicos da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos tem cerca de 100 técnicos apenas para registro, outros 240 na reavaliação e 90 avaliando o impacto ambiental.

Adicionalmente, o Poder Legislativo tem uma bancada ruralista coesa, atuante, que corresponde a cerca de 25% do Senado e do Congresso Nacional. A atuação dessa bancada vem dificultando o avanço das medidas protetivas quanto ao uso de agrotóxicos, pois, entre outras ações busca retirar o poder 

Um dossiê sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde, lançado em 2015 pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO), ilustra como os Três Poderes tem suas ações limitadas pela bancada ruralista e suas extensões:

Hoje, vigora no Brasil um pacto político-econômico em que predominam os interesses da bancada ruralista, entre os quais a liberalização no trato da questão do uso de agrotóxicos no âmbito do Legislativo (mais de quarenta projetos de lei nessa direção), do Executivo (pressões sobre órgãos reguladores como a Anvisa), do Judiciário (impunidade nas mortes no campo), da pesquisa (mais de 95% dos recursos da Embrapa estão voltados para o agronegócio) e da mídia (o agronegócio possui até canais de televisão) (CARNEIRO, 2015. P. 187).

Por fim, muito ainda precisa ser feito para solucionar os problemas associados ao uso dos agrotóxicos no Brasil. Os órgãos de vigilância e os consumidores precisam somar forças para que, juntos, o sistema de produção e distribuição de produtos mude sua estrutura, visando diminuir a utilização de pesticidas associados ao incentivo à agricultura mais sustentável, ou seja, uma agricultura que respeite o ambiente, seja justa do ponto de vista social sendo economicamente viável. A agricultura para ser considerada sustentável deve garantir, às gerações futuras, a capacidade de suprir as necessidades de produção e qualidade de vida no planeta.


REFERÊNCIAS
BEDOR, C. N. G. Estudo do potencial carcinogênico dos agrotóxicos empregados na fruticultura e sua implicação para a vigilância da saúde. 2008. Tese (Doutorado em Saúde Pública) – Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães, Recife, 2008.

BRAGA, I. F. A. Alterações Tireoidianas em Pacientes Expostos a Organoclorados. 2012. 120 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Saúde Coletiva, centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.

BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria Nº 3.252, de 22 de dezembro de 2009. Aprova as diretrizes para execução e financiamento das ações de Vigilância em Saúde pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios e dá outras providências. BRASIL. Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA). Relatório De Atividades De 2011 e 2012. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/58a5580041a4f6669e579ede61db78cc/Relat%C3%B3rio+PARA+2011-12+-+30_10_13_1.pdf?MOD=AJPERES. Acesso em: 22 fev. 2016.

CARNEIRO, F. F. (Org.). Dossiê ABRASCO: um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde. Rio de Janeiro: EPSJV; São Paulo: Expressão Popular, 2015. 624 p.: il.

KUSSUMI, T. A. Desenvolvimento de Método Multirresiduo Para Determinação de Pesticidas Benzimidazóis, Carbamatos e Triazinas em Milho por Cromatografia Líquida Aacoplada à Espectometria de Massas em Tandem e sua Certificação. 2007. 152 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Tecnologia Nuclear - Materiais, Universidade de São Paulo, São Paulo.

LONDRES, F. Agrotóxicos no Brasil: um guia para a ação e defesa da vida. Rio de Janeiro: AS-PTA. Assessoria e serviços a projetos em agricultura alternativa, 2010. 190 p.: il., 23 cm.

MARASCHIN, L. Avaliação do Grau de Contaminação por Pesticidas nas Água dos principais rios formadores do Pantanal Mato-Grossense. 2003. 88 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Programa de Pós-graduação em Saúde e Ambiente, Departamento de Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2003. Cap. 2. Disponível em: <http://www.cpap.embrapa.br/teses/online/DST23.pdf>. Acesso em: 26 fev. 2016.

PEIXOTO, S. C. Estudo da estabilidade a Campo dos Pesticidas Carbofurano e Quincloraque em Água de Lavoura de Arroz Irrigado empregando SPE e HPLC-DAD. 2007. 108 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Programa de Pós-graduação em Química, Departamento de Centro de Ciências Naturais e Exatas, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2007. Cap. 2. Disponível em: <http://cascavel.cpd.ufsm.br/tede/tde_arquivos/6/TDE-2007-11-26T180311Z-1033/Publico/SANDRA PEIXOTO.pdf>. Acesso em: 26 fev.2016.

MATA, J. S, Ferreira. R.L, Agrotóxico No BrasilUso e Impactos ao Meio Ambiente e a Saúde Pública, Agosto 2, 2013. Disponível em: http://www.ecodebate.com.br/2013/08/02/agrotoxico-no-brasil-uso-e-impactos-ao-meio-ambiente-e-a-saude-publica-por-joao-siqueira-da-mata-e-rafael-lopes-ferreira/ Acesso em: 26 fev. 2016.

PERES, F, Oliveira-Silva JJ, Della-Rosa HV, Lucca SR. Desafios ao estudo da contaminação humana e ambiental por agrotóxicos. Ciência Saúde Coletiva. 2005; 10 Supl:27-37.

SILVA, J.M.C. hematológicos na Região Sul de Minas Gerais(Tese Doutorado) para obtenção do título de Doutor em Saúde Coletiva, área de concentração em Saúde Coletiva). Campinas, SP: [s.n.], 2008. Disponível em: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=000431760&fd=y. Acesso em: 26 fev. 2016.

SIQUEIRA, S.L; KRUSE, M.H. L. Agrotóxicos e Saúde Humana: Contribuição dos profissionais do campo da saúde. Revista Escola de Enfermagem da USP, São Paulo, v. 1, n. 1, p.584-590, 21 fev. 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v42n3/v42n3a23.pdf>. Acesso em: 23 fev. 2016.

VEIGA, M. M; DUARTE, F. J. C.M; MEIRELLES. L. A; GARRIGOU, A; BALDI. I; A contaminação por agrotóxicos e os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs). Rev. Bras. Saúde Ocup., São Paulo, 32 (116): 57-68, 2007.

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